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Um primeiro trimestre, para não haver outro...

Daniela Filipe Bento Daniela Filipe Bento Seguir 4 de abril de 2025 · 4 mins read
Palmeira oscilando com o vento de uma tempestade
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Este último trimestre não foi fácil. Foi um início de ano conturbado e com bastantes oscilações, entre o cansaço, a apatia e a melancolia. As dificuldades em cumprir os meus objetivos foram evidentes, bem como cumprir com o que quer que me pedissem. No emprego senti que tudo se complicou, não porque o trabalho mudou, mas porque a minha capacidade de dar resposta decresceu bastante. Simultaneamente, na vida pessoal e no ativismo, paralisei. Consecutivamente deixei de cumprir obrigações que tinha, bem como deixei passar o meu próprio autocuidado para um lugar que não chega há bastante tempo.

Sei que senti a minha energia ir para valores muito baixos, e não só a energia, mas o meu próprio estado anímico. A tristeza acompanhou-me grande parte do tempo, uma tristeza profunda, uma melancolia de deixar os meus pequenos (o Misako e o Emi) quase ao abandono. A dificuldade em gerir emoções e expectativas estava em saldo negativo. Tive de fazer um esforço muito grande para conseguir manter alguma funcionalidade e alguma vontade de viver.

Não foi fácil acordar sem vontade de me levantar e adormecer sem vontade de acordar. Os dias podiam ter 24 horas, a maioria do tempo… usado para dormir, dormir, dormir. Pausas eram usadas para dormir, refeições usadas para dormir e viagens usadas para dormir. Tudo era uma desculpa para dormir e não sentir o mundo. Tudo era uma forma de me desligar e desconectar de mim. Pois eu não estava a conseguir viver conectada comigo. Não me encontrava. Não me achava. Não me localizava.

Felizmente agora estou melhor, a tomar decisões mais saudáveis, a tomar iniciativas mais cuidadoras de mim. Aos poucos, aos poucos as coisas vão mudando. Porém fica a tristeza do que poderia ter sido feito e não foi, a culpa por não ter feito e a frustração por não conseguir me colocar em mais lugares que gostaria de estar. Compreendo o meu estar e é por isso que o aceito e deixo-me vivênciá-lo como deve ser e permitir-me refletir nos passos seguintes. Aos poucos começo a fazer coisas que gosto, a organizar-me melhor, a ter a capacidade de interagir… mas isto teve e tem custos. Tem custos sociais, o afastamento de pessoas, a dificuldade de comunicar as minhas necessidades, o meu fechamento em mim mesma. Toda uma dinâmica de perder sensibilidade à vida.

Amor, não o amor romântico, mas o amor pelas coisas, pelas pessoas e pela vida. Perdi. Perdi esse amor, perdi essa vontade, perdi essa dinâmica e, tudo isto, deu lugar a medo, preocupação, isolamento, quebra de capacidade de fazer tarefas que normalmente gosto, perdi a vontade de estar com quem quer que seja em que registo for. Perdi amor. Amor de viver. Preciso de me apaixonar novamente, preciso apaixonar-me por mim, e novamente pelas pessoas. Preciso sair deste registo.

Acordo de manhã com um peso na consciência por tudo o eu deixei para trás, porém também acordo com algum alívio por me sentir sair deste registo, ainda que devagar e devagarinho. Mas vou sair. Ter consciência das minhas oscilações é um passo gigante para a minha estabilidade. Saber com o que conto e com que conto. Apesar deste saber ser difícil, é a prática que dita a nossa capacidade de escolha e seleção. Estou neste momento a procurar encontrar-me e penso que aos poucos já me vou vendo e me reconhecendo. É difícil, é… mas é possível e eu vou conseguir, só preciso de tempo e espaço. Só preciso ganhar paixão novamente. Só preciso de me amar novamente e sem medo de gostar de mim, sem medo de aceitar que sim, até posso ser uma boa pessoa, que sim até pode ser bom estar comigo, que sim, até pode ser bom viver um projeto de vida comigo mesma. Neste sentido quero amar, quero amar chegar a casa, mas também amar sair de casa. Quero amar os meus pequenos, quero amar as pessoas que me rodeiam e quero amar as coisas que faço. Quero amor. E isso é um processo de autocuidado revolucionário, muito revolucionário. Saber o que queremos para nós e como queremos e com quem queremos é fazer a revolução, é amar na vida e não amar na expectativa. É verdadeiramente amar.

Por isso eu quero um segundo trimestre do ano melhor, mais rico, menos triste e com crescimento pessoal, com paixão e muito cuidado, com muito amor.

Por isso eu quero um segundo trimestre do ano melhor, mais sorridente e cheio de emoções e cheio de vontades, com direito à vida.

Por isso eu quero um segundo trimestre do ano melhor, sem culpa, sem frustração desnecessária, sem… sentir-me morta para tudo.

Por isso eu quero…

Dani

Imagem: Suparerg Suksai - Thailand

Daniela Filipe Bento

Escrito por Daniela Filipe Bento Seguir

escreve sobre género, sexualidade, saúde mental e justiça social, activista anarco/transfeminista radical, engenheira de software e astrofísica e astronoma