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Momentos numa sala a ver A Rapariga Dinamarquesa

Daniela Filipe Bento Daniela Filipe Bento Seguir 24 de janeiro de 2016 · 2 mins read
Momentos numa sala a ver A Rapariga Dinamarquesa
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Ontem, Sábado, fui ver o filme “A Rapariga Dinamarquesa”. Fui. Chorei. Não quero escrever sobre o que está bem feito, não quero escrever sobre o que está mal feito no filme. Não quero perder-me no debate sobre a qualidade da história ou a aproximação da realidade. Não porque não tenha isso em consideração, mas sim porque quero escrever sobre como a mensagem me chegou e me tocou… independentemente da película que vi no ecrã, dos actores, da realidade ou da ficção.

A Rapariga Dinamarquesa

Chorei. Não por tristeza, não por felicidade, mas por me sentir remexida. Eu remexi-me, eu própria provoquei esse movimento interior sobre a minha existência, os meus dias e o meu futuro, o meu presente e o meu passado. O filme foi um pretexto, uma oportunidade. Não foi, nem será o único filme capaz de o fazer. Pois eu sinto e devo permitir-me sentir. Às vezes eu choro com comédias, às vezes eu rio com a desgraça… eu emociono-me, eu vivo.

Existiu um detalhe, um detalhe que é, talvez e na sua medida, insignificante, mas foi o que me puxou para a superfície alguns sentimentos. A vontade e determinação, a iniciativa de Gerda Wegener em fazer parte de uma auto descoberta de Lili Elbe. Um pedaço de tempo em que esqueci o filme, o drama da pseudo-biografia e a vaga inspiração numa história real permitiu-me olhar a realidade da minha própria vivência. Não do último dia, ou mês, ou ano, mas sim de todos os meus anos. A vontade e determinação de Gerda contrastam com algo que senti muito no presente através das memórias do passado, a não vontade e não determinação de estar próximo. E, com os devidos cuidados quando se escreve estas palavras, as distâncias que se vivem através da proximidade da amizade, a palavra que foi esquecida, o desabafo que não foi tido em conta, o isolamento interior e concretização de um caminho que passa por um mundo solitário, pelas questões e pelas dúvidas e, essencialmente, pela não presença e incapacidade (natural ou não) de sentir-mos que o mundo é capaz de receber o que potenciamos de melhor. Percebi pela vivência presente, o caminho que percorri em confronto com a incapacidade de sorrir de dentro. Hoje, sinto-me uma pessoa com sorte, a vários níveis. No geral sinto-me bem, existem várias frentes da minha vida que me correm de uma forma fluída, com percalços naturais de quem vive. Porém não posso deixar de relembrar um percurso que fiz, de uma forma paralela, no fruto da incerteza e contrastes de relação vazios, onde a minha voz desaparecia no momento em que se fazia ouvir. Na falta de vontade de estar, de incluir, de conhecer o outro na sua forma completa, sem medos, sem julgamento.

“A Rapariga Dinamarquesa” tem sido um filme polémico em vários sentidos (bons e/ou maus), mas estas linhas não são sobre o filme, mas sobre o meu contacto com ele, sobre uma realidade pessoal.

Dani

Artigo re-publicado em www.queeringstyle.com a 25 Janeiro, 2016

Daniela Filipe Bento

Escrito por Daniela Filipe Bento Seguir

escreve sobre género, sexualidade, saúde mental e justiça social, activista anarco/transfeminista radical, engenheira de software e astrofísica e astronoma