Faltam pouco mais de 10 dias para o final do ano 2020. Não poderia deixar passar o momento sem uma pequena reflexão sobre os meus estares, as minhas realidades, os meus sentires. Há um ano, neste dia, lutava comigo mesmo sobre se teria capacidade de voltar a trabalhar em Janeiro. Antevia um percurso de recuperação longo após uma crise depressiva grave. O meu estado ainda não era muito conclusivo sobre a possibilidade de conseguir tomar a rotina sem que entrasse novamente em crise. Foi um mês de decisões.
Acaba o ano e decido voltar a tentar trabalhar em Janeiro, sabia que me iria custar no início, ganhar ritmo, ganhar engrenagem e conseguir atender a todas as demandas que me surgiam. É verdade que consegui adaptar-me com alguma eficácia, também o ambiente em que estou inserida contribuiu para essa adaptação. Dois meses depois chega a pandemia derivada da COVID-19 e fico novamente recolhida em casa, com a diferença de que agora estou a trabalhar. Porém, sem qualquer forma de ver as pessoas que quero, que amo, que estabeleço algum tipo de vínculo. Estou no isolamento, estou isolada do mundo enquanto recupero da depressão. Os meus contactos passam a existir em plataformas digitais, mas não mais do que isso. O medo apoderou-se das pessoas, da sociedade em geral e também de mim. Como iria eu superar este momento?
É verdade que hoje olho para esses dias e lembro-me que sentia medo, não queria voltar ao sítio de onde vim. Não queria de todo voltar a esse lugar. Foram vários meses muito duros dos quais me recuperei. Porém, sinto hoje estabilidade e confiança. Sinto que dei um passo largo no meu crescimento interior, pessoal e emocional. Fui tomando decisões ao longo destes meses, decisões que complementam o meu estar, a minha saúde, física e mental. Algumas dessas mudanças foram mais dolorosas do que outras, mas de uma importância vital para a manutenção do meu bem estar, da minha energia e capacidade de estar no mundo.
A pandemia tornou-se um freio para toda a minha interação social. Ainda que eu seja, no geral, uma pessoa introvertida, a obrigatoriedade de confinamento trouxe-me algumas dificuldades concretas. Porém, algumas coisas que aprendi durante a minha última crise depressiva serviram relativamente bem neste contexto. As minhas rotinas deram-me estabilidade e permitiram-me ter sempre perspectiva em relação ao dia seguinte. Permitiram-me manter em contacto comigo mesma e, da forma que podia, com o mundo. É verdade, não sou fã da comunicação via Internet e isso ficou bastante claro nestes últimos meses. É uma comunicação que sinto limitante e redutora da minha linguagem e por isso tenho tendência a ter dificuldades em manter diálogos em conversas online. Isso demonstrou-se um desafio. Ainda hoje o é.
Estabilidade e confiança surgiram naturalmente deste modelo que tenho aplicado. Rotinas bem definidas, saídas higiénicas à rua, planos de dia para dia, momentos de descanso e prazer. Momentos de contacto com as pessoas, ainda que tenha dificuldade em manter o contacto digital - vou praticando. Também tenho de agradecer às pessoas que tiveram comigo durante este período, apesar das limitações, tornaram-se fundamentais na minha forma de estar. Principalmente os esforços feitos por quem amo para que a distância não fosse um problema. Hoje, e comparando com o ano anterior, acordo com vontade de viver o dia e de continuar viva. Acordo com a energia de quem está descansada, de quem está pronta para os desafios do dia a dia. Continuam a existir momentos difíceis e nesta época de fim de ano costumo fazer algumas reflexões que por vezes mexem bastante com o meu estar. Porém a vontade de superar o problema é maior. A vontade de continuar cada dia a dar o melhor de mim. A tomar ações sobre aquilo que sinto e aquilo que desejo.
Com o fim de ano vem a perspectiva de um ano seguinte mais rico, mais enriquecedor, mais confiante. Sem medos, sem o receio de voltar a sair à rua e ter um ataque de pânico, sem o receio de voltar a sair à rua e o coração explodir, sem o receio de voltar a sair à rua e ficar sem ar para respirar. Entendo, hoje, que estes meses obrigaram-me a pensar e a repensar os meus dias, as minhas necessidades e os meus desejos. Obrigaram-me a parar, a reduzir o ritmo que estava a viver e a entender melhor os momentos com atividade reduzida e descanso.
Algo que hoje ainda continuo a aprender a descansar, a desfrutar de cada momento, de sentir e de me permitir sentir. Hoje ainda continuo a aprender, a aprender para o amanhã ser melhor. Hoje ainda continuo a aprender, a aprender para continuar a crescer, a aprender para continuar a sorrir.
Dani